Nesses últimos anos, principalmente em função do surgimento de tantos negócios digitais, muito tem se falado sobre modelos escaláveis de vendas B2B. Contudo, mesmo com esses novos modelos de negócios, as vendas complexas sempre existirão, pois é praticamente a única forma de vender soluções robustas para grandes empresas.
O que diferencia uma venda simples de uma venda complexa, em linhas gerais, é:
Em vendas simples o ciclo de vendas é mais rápido, o ticket mais baixo e tamanho do mercado potencial é, normalmente, bem grande. Nesses casos, grande parte das atividades de vendas é feita de forma digital, onde é possível tratar vários clientes ao mesmo tempo e aplicar automações. A área de vendas participa das etapas finais, somente para ajudar o cliente a se decidir.
Já nas vendas complexas, o ciclo de vendas é bem mais longo, o ticket é alto e tamanho do mercado é reduzido. O processo é praticamente todo dependente de pessoas, desde a geração do lead até o fechamento do negócio e, normalmente, passa por mais de um responsável, tanto do lado da empresa que vende a solução, quanto da que contrata.
Ambas as modalidades de vendas podem dar dinheiro, sendo que uma escala no volume de vendas, enquanto a outra traz ganhos no valor de cada venda. É essencial que a empresa defina o seu modelo, que envolve processos de vendas, preços praticados, tipos de cliente etc. Existem inúmeras empresas bem-sucedidas em ambos os modelos e ambos apresentam risco.
Empresas com vendas simples só passam a ganhar dinheiro de verdade quando a base de clientes é grande e, para escalar, é preciso investir dinheiro na frente. Por isso, tantas empresas digitais são criadas todos os anos e ficam pelo caminho.
Empresas com vendas complexas, normalmente as com modelos mais consultivos e customizados para cada cliente, simplesmente não escalam. O fato de essas empresas não escalarem em volume não significa que o negócio não pode crescer em termos de receita. Ainda que uma empresa com vendas complexas não consiga realizar centenas ou milhares de vendas por mês, ela tem o benefício de fechar vendas de 6 dígitos ou mais.
O maior problema das empresas com vendas complexas é o efeito "pico e vale". No mês que a empresa fecha algumas vendas, pelo fato de o ticket ser alto, tudo fica bom, a sensação é de que o negócio está saudável e crescendo. Logo depois, vem uma sequência de meses com baixa em vendas, o que derruba qualquer expectativa de crescimento.
Viver entre picos e vales traz vários problemas para o negócio, e o principal deles é que a receita oscila, enquanto os custos se mantém constantes. Além de a empresa não crescer, a conta pode não fechar, o que significa perder bons profissionais e, na pior das hipóteses, fechar o negócio.
Vamos abordar abaixo algumas boas práticas para negócios consultivos e/ou com vendas complexas atravessarem a fase dos "picos e vales" e cresceram em receita:
Especialize seu negócio
Se sua empresa possui um tipo de produto ou serviço que traz muita complexidade da venda para a entrega e está mirando no mercado SMB, você está fazendo isso errado.
Para ganhar dinheiro vendendo no mercado SMB, é preciso ganhar no volume e na agilidade, cobrando tickets menores individualmente – ou seja, venda simples. Se a venda é complexa, o ticket precisa ser alto para compensar, isso significa vender para empresas maiores.
Como vender para uma empresa grande se minha empresa é pequena? A resposta é especialização. Sua empresa não precisa ser gigante para ser uma referência em algo. Escolha um nicho e foque nele.
Quando se opta por operar com vendas complexas, é interessante encarar sob a perspectiva de focar com clientes onde o volume é menor e o ticket é maior. Pelo trabalho que dá atender cada cliente, é preciso focar nos clientes certos para garantir lucratividade na venda.
Quais tipos de clientes dão maior retorno financeiro para sua empresa? Quais são os que sua empresa tem maiores diferenciais e perspectivas de ganhos? Esses são os tipos de clientes que sua empresa precisa se especializar e focar.
É essencial investir na qualificação dos leads, tanto os que chegam (inbound) quando os que a empresa prospecta (outbound). Investir tempo e dinheiro no tipo de cliente errado, principalmente considerando o tempo de permanência deste no ciclo de vendas, quantidade de reuniões envolvidas etc., é um tiro no pé. Mesmo que a venda seja fechada, a empresa pode ter perdas significativas ao vender para o cliente errado.
Foque em geração de leads
A maioria das empresas com vendas complexas falham na geração de leads – geram em qualidade e quantidade abaixo do necessário. Para atravessar os "picos e vales" e ter mais previsibilidade de pipeline, a base é uma geração de leads consistente.
É comum que as empresas de vendas complexas vivam de leads orgânicos e indicações de outros clientes. Algumas até investem em algum canal de marketing, como Google Adwords. Mas essas iniciativas logo atingem um teto, que normalmente está abaixo da ambição de crescimento da empresa.
Compartilhamos abaixo como explorar as duas principais vias de geração de leads B2B em uma empresa de vendas complexas:
Gerar leads via inbound
Embora o inbound marketing seja bastante conhecido nos meios de negócios digitais e ofereça muitas vantagens para negócios com vendas simples – ajuda a educar clientes em altos volume e automatizar grande parte dos processos – ele pode ser uma excelente estratégia para negócios com vendas complexas.
Engana-se quem ainda pensa que inbound e outbound são estratégias opostas, que servem para tipos diferentes de negócio. Empresas que sabem explorar o melhor de cada uma das estratégias podem alcançar excelentes resultados e explorar grandes diferenciais competitivos.
Segue abaixo uma sugestão de processo para uma empresa de vendas complexas explorar o inbound marketing:
- Escreva artigos de blog com: (a) foco em palavras-chave que remetem aos problemas que seus prospects pesquisam no Google e/ou (b) com alto potencial de compartilhamento entre as pessoas. Em ambos os casos, é essencial que os conteúdos sejam de qualidade – principalmente tratando-se de vendas complexas, a empresa precisa transmitir autoridade e confiança, por isso deve tomar cuidado com o que escreve/publica;
- Direcione o tráfego desses conteúdos para páginas de inscrição para webinars. Nesses webinars, além de o contato ser mais pessoal, o assunto é explorado de forma mais profunda e os leads podem aproveitar para tirar suas dúvidas ao vivo;
- Faça contato com os leads que participaram dos webinars e que estão dentro dos critérios de perfil de cliente ideal. Uma dica interessante neste ponto, que vejo poucas empresas explorarem: no lugar de começar a trabalhar a venda de um grande projeto que pode levar meses para fechar, mire vender algo menor, como um workshop envolvendo sua empresa e o cliente;
- A partir do workshop, sua empresa se aproximará mais do cliente. Este, por sua vez, passará a confiar mais na sua empresa, pois conhecerá alguns profissionais pessoalmente, e a sua empresa já pode começar a diagnosticar o cliente e a encontrar oportunidades para vendas maiores;
- Ao executar esse processo repetitivamente, passando por todas essas etapas, sua empresa terá sempre potenciais negócios sendo transferidos para um pipeline de vendas complexas com tickets altos.
Vale salientar que os webinars e os workshops podem ser cobrados, sendo essa uma forma de sua empresa monetizar o conhecimento interno, reduzir o custo de aquisição de cliente e até fazer lucro. Convenhamos, se o foco da sua empresa é vender para grandes empresas, essas não se importam muito em investir alguns milhares de reais para promover workshops internos e discutir problemas e oportunidades.
Gerar leads via outbound
Construir uma estratégia de marketing de conteúdo para falar com milhares de empresas, sendo que realmente poucas delas irão tornar-se clientes, pode não ser a alternativa mais rápida e menos custosa de se gerar leads.
É preciso considerar que conteúdos não servem apenas para atrair tráfego para blogs e gerar inbound leads. Em vendas complexas, os conteúdos são úteis ao longo de todas as etapas do processo e falaremos mais sobre isso no tópico abaixo, sobre inbound.
Contudo, para endereçar empresas maiores e de forma mais rápida e certeira, o outbound pode ser mais adequado na etapa de geração de leads. Quando falamos em outbound, estávamos falando especificamente sobre prospecção.
Muitas empresas tiveram péssimas experiências com prospecção nos últimos anos, seja por terem colocado as pessoas erradas na função, por terem trabalhado sem os métodos e as ferramentas adequadas ou por terem contratado empresas que prometeram e não entregaram resultados. Atualmente existem técnicas de prospecção outbound muito mais efetivas.
Para não estender muito o tema, vou explicar o processo por etapas e indicar conteúdos que exploram melhor cada um dos temas:
- Defina quais tipos de clientes priorizar (falamos sobre isso mais acima) e quem são os tomadores de decisão nas empresas (artigo: como escolher e focar um nicho);
- Encontre os tomadores de decisão de empresas do segmento e localidade que irá prospectar – utilize o LinkedIn para isso – e construa listas com dados de contato (artigo: como prospectar usando o LinkedIn);
- Crie as mensagens que serão utilizadas na abordagem desses prospects. Priorize abordar através de cold mail, pois é mais rápido de testar, custa menos e, em muitos casos, apresenta melhores resultados; (artigos: técnicas de cold mail e templates de cold mail);
- Sistematize um esquema de cadências. Caso trabalhe com prospecção 100% via e-mail, conseguirá automatizar grande parte do processo. Caso seu mercado funcione melhor com cadências mistas, dedique tempo em planejar e analisar os progressos (artigo: cadências de prospecção e vendas);
- Identifique os prospects que reagem positivamente às abordagens – respondem aos e-mails aceitando contato, por exemplo – e transfira-os para o CRM onde os vendedores iniciarão o atendimento (artigo: automação de vendas).
Como dito no início desse tópico, não procure qual investir entre inbound e outbound, e sim, como explorar o que cada um oferece de melhor. Implemente, teste e colete os aprendizados para que cada novo ciclo seja melhor que o anterior.
Especialize seu time de vendas
Vendas complexas não são corridas de 100 metros, onde um único profissional consegue fazer. Uma venda que leva de 6 a 12 meses deve ser quebrada em várias etapas que demandam profissionais com diferentes especializações.
Além do benefício da especialização – ou seja, alocar o profissional certo na etapa certa da venda – segmentar o time de vendas por funções pode aumentar significativamente a produtividade do processo.
Uma empresa que faz vendas complexas, provavelmente, precisa visitar seus clientes e, para tanto, trabalha com profissionais de field sales. Se além das visitas – e tudo o que as sucede, como escopos, propostas, negociações etc. -, esses profissionais estão responsáveis por fazer a qualificação dos leads que chegam, certamente, não darão conta de fazer o trabalho com qualidade. Os problemas de deixar o mesmo profissional de vendas fazendo tudo são:
- Faltarão leads por falta de tempo dos profissionais de gerá-lo;
- Leads qualificados passarão para frente, pois não há tempo para qualificar e, com o baixo volume de leads, até mesmo os ruins acabam sendo aceitos;
- Os negócios no pipeline não receberão a devida atenção pois, além de cuidar de seus pipelines, os vendedores precisam se preocupar em enchê-los.
Ter uma equipe de SDRs, que é responsável por prospectar leads, sejam eles inbound ou outbound e qualificá-los para passar para o time de vendas, trará benefícios como: (a) aumentar o volume de leads e oportunidades gerados e (b) evitar que os profissionais de vendas percam tempo e dinheiro visitando os clientes errados.
Pratique técnicas de vendas consultivas
Um dos maiores erros que empresas e vendedores cometem é tentar aplicar técnicas de vendas simples em vendas complexas. São os famosos "tiradores de pedido" – se a venda acontece, não sabe direito o que fez. Quando não fecham vendas, colocam a culpa no cliente.
Em vendas simples, o impacto financeiro é menor e, na maioria dos casos, uma única pessoa toma toda a decisão – o dono da empresa, por exemplo. Já em vendas complexas, o investimento financeiro é maior, os impactos nos processos internos do cliente demandam disponibilidade de tempo e de equipe e, em função de todos esses recursos envolvidos, dificilmente um único profissional decide tudo sozinho.
Para entender todos esses aspectos envolvidos como o cenário em que o prospect se encontra, capacidade de investimentos, disponibilidade de equipe, urgência para resolver as necessidades, quem são os decisores que precisam ser envolvidos, entre outras, é preciso saber fazer as perguntas certas.
Mais do que fazer perguntas abertas e fechadas, entender de psicologia, dialética com cliente e técnicas de fechamento, os vendedores precisam ser grandes conhecedores dos seus produtos e do negócio dos seus clientes. Isso somado às técnicas e metodologias, fará com que um vendedor seja um consultor genuinamente interessado em ajudar o cliente a resolver seu problema.
Entre tantas metodologias e frameworks disponíveis, vale destacar o bom e velho SPIN Selling para conduzir a venda de forma a: (a) fazer as perguntas certas nos momentos adequados, (b) conseguir fazer colocações sobre suas soluções em complemento às falas do cliente e (c) lidar com as objeções. Embora o foco do artigo não seja aprofundar no SPIN, vale trazer uma visão geral:
- Perguntas de situação: entender melhor o cenário atual do prospect, como o papel daquele contato dentro da empresa, como funcionam determinadas áreas da empresa, onde os investimentos são direcionados, quais soluções utilizam atualmente etc. Cuidado para não fazer perguntas óbvias, que poderiam ser respondidas com algum tempo de dedicação conhecendo mais sobre o prospect na internet;
- Perguntas de problema: uma vez entendido o cenário atual do prospect, já é possível pressupor alguns problemas. Aqui cabem perguntas para entender os desafios e anseios do prospects, onde ele acredita que está perdendo dinheiro e o que faz ele perder o sono. Vendedores mais avançados conseguem fazer os prospects enxergarem problemas que eles próprios não sabiam que tinham;
- Perguntas de implicação: uma vez entendidos os problemas do prospect, cabe fazer algumas perguntas que ajudem a ampliar esses problemas. Por exemplo, "você comentou que hoje perde 100 mil reais por mês com esse problema – o que acontecerá com a sua área se esse problema persistir pelos próximos 6 meses?". Quanto melhor o vendedor conseguir entender o cenário e os problemas dos prospects, mais coerentes serão as conexões de implicação que ele fará;
- Perguntas de necessidade: este é o ponto onde é possível conectar a solução aos problemas. O foco é, além de deixar claro como a solução pode ajudar, é continuar trabalhando perguntas que ajudem o prospect a assumir seus problemas e visualizar como sua vida ficaria tendo eles resolvidos.
Entender a fundo a necessidade do cliente, trabalhar de modo a conquistar a confiança, possibilita ao vendedor fazer algo muito importante em vendas consultivas, que é aumentar o ticket da venda.
Ao passo que, em vendas simples, o cliente está habituado a pedir descontos e o vendedor tem uma margem para negociar, em vendas complexas a precificação é construída a partir de um escopo que contempla a solução que resolverá de fato as necessidades do cliente: tecnologias envolvidas, cronogramas, tipos de profissionais que executarão o trabalho, quantidades de horas etc. Por isso, é essencial que o vendedor consiga investigar e diagnosticar a fundo, tanto para não deixar dinheiro na mesa, quanto para não causar prejuízo para a empresa vendendo errado.
Um comentário final sobre vendas complexas: não é difícil faturar alto logo nos primeiros meses de uma empresa que vende projetos, consultoria e serviços customizáveis. O que a maioria das empresas não conseguem dominar são os canais de marketing e os processos de vendas que ajudarão a empresa gerar e fechar repetidamente os negócios que garantirão a receita e o crescimento.